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A minha contribuição e reflexão para este tema tem como base o trabalho desenvolvido, onde tive a oportunidade de trabalhar como assistente social e investigadora num bairro multicultural (Quinta da Vitória) onde se cruzavam famílias oriundas de diferentes culturas e religiões, particularmente a hindu, onde a religião desempenha um papel fundamental.
Vivemos num tempo de grandes transformações, caracterizado por um lado, pela velocidade a que a tudo se acede e, por outro, uma sociedade onde o diferente, o Outro, se torna cada vez mais presente e se assume numa sociedade multicultural.
Não é possível compreender a riqueza das culturas sem o seu conhecimento, o que implica o conhecimento das suas religiões e da sua história. O desconhecimento do fenómeno religioso de um grupo étnico, pode originar um empobrecimento significativo no trabalho com pessoas oriundas desse grupo específico e pode levar a atitudes de intolerância e de indiferença.
No caso concreto da comunidade hindu do bairro da Quinta da Vitória, pude constatar que a religião constitui um factor de integração destas famílias, essencial ao seu processo de adaptação no país de destino, uma vez que são nos templos que as famílias hindus estabelecem redes fundamentais para a resolução de problemas e para a satisfação de algumas necessidades. Na verdade, é nos templos que encontram apoio social, bem como a dinamização de um conjunto de actividades e serviços.
Relativamente às famílias de religião hindu estas revelam um sentimento e uma atitude religiosa na sua vida quotidiana. Estas famílias respeitam muito os rituais e eventos religiosos, sendo a religião o centro e o caminho das suas vidas, daí verifica-se a importância e a fidelidade diária a que se submetem as práticas religiosas.
A questão religiosa é o traço unificador da identidade cultural dos hindus. O factor religioso manifesta-se de uma forma recorrente na vida quotidiana desta comunidade, tanto pela forma como cada família organiza os seus cultos religiosos diários, como pela distribuição do seu calendário-lunar.
O calendário hindu é rico em festividades, cada uma delas destinada a celebrar um deus ou um momento da vida de um deus. Estas celebrações proporcionam a reunião de todos os hindus, que em conjunto festejam, dançam, cantam e oram em honra de deus.
A religião é o eixo de união e também de orientação dos hindus, que actuam e vivem de acordo com os princípios e ensinamentos básicos do hinduísmo. É o que os une e, ao mesmo tempo, os distingue das outras pessoas.
Todas as casas hindus possuem um mandir, sob a forma de um altar doméstico, onde se encontram colocadas figuras, imagens, estátuas de deuses e fotografias de filhos ou antepassados que já faleceram. Para além destas figuras, existe um prato onde é colocada comida e doces feitos diariamente e que é primeiro oferecida aos deuses, antes de ser consumida pelos membros da família.
Este lugar é cuidado diariamente e alvo de oração diária por parte de todos os residentes da casa.
O local mais referenciado pela população hindu, é o mandir (templo) pois exerce uma função agregadora da identidade cultural e religiosa. Os templos encontram-se destinados a cerimónias mais solenes ou a festividades, pertencendo ao sacerdote a tarefa de cuidar do templo, de realizar cerimonias e orientar nas orações e na interpretação dos textos sagrados.
E é no próprio bairro onde residem, que as relações de vizinhança e de amizade, a par da família, figuram como a mais importante rede de sociabilidade. A existência de familiares, amigos e vizinhos que dão um apoio efectivo e que proporcionam um suporte social sólido, contribui para a criação de sentimentos de segurança, pertença e preservação da sua identidade. São estas redes de proximidade, particularmente as de carácter informal, que permitem aos hindus lidar com os problemas que surgem no dia a dia, relacionados com o trabalho, habitação, identidade cultural, possibilitando uma maior adaptação ao país de acolhimento.
Relativamente às famílias, as relações de vizinhança estão muito ligadas às relações familiares e à existência de festividades, onde nestas cerimónias se tornam ponto de encontro entre as mesmas. Aquilo que sobressai e que confirma como mais evidente, quanto à relação de vizinhança, é que as vizinhas mais visitadas e com quem se mantêm relações de amizade, são as que fazem parte das suas “famílias alargadas”.
A família é tida como o núcleo agregador, onde se vai buscar a força, os conselhos, as opiniões e apoio, quer espiritual, quer social. Os laços familiares são muito fortes, próximos e respeitados.
A existência de associações culturais e religiosas, para além de facilitarem a integração dos migrantes na sociedade de acolhimento, promovem a interacção e disponibilizam serviços de apoio e entreajuda às famílias, nas várias áreas.
As famílias hindus possuem as suas próprias redes sociais de solidariedade, constituindo comunidades com crenças, estilos de vida próprios, rituais, valores que os caracterizam e que formam a sua identidade cultural, religiosa e social.
Reflectir sobre o fenómeno religioso bem como as suas implicações na sociedade, compreender a religião como expressão da cultura e da identidade individual e colectiva e a forma como esta se reflecte numa cultura, surge como uma urgência no quotidiano dos profissionais de Serviço Social, mas também diz respeito a todos, enquanto cidadãos, que estão em contacto com o Outro.
Hélia Bracons
Docente de Serviço Social na Universidade Lusófona, Lisboa